terça-feira, 25 de setembro de 2007

Mosaico Mano Brown



Mano Brown é uma das figuras mais importantes da música brasileira. Exagero para playboy ou para puritanistas do som. Não é qualquer pessoa que lidera a criação de um gênero no país. Principalmente de um com tantos ângulos a serem debatidos, enxergados, ruminados, como é o rap nacional. Qualidade musical ou intelectual à parte, ouvir Racionais é fundamental para a compreensão do Brasil. "Existem os que ficam no beco dos tristes. Em vez de ficar recriminando, vai lá pra entender o que eles estão pensando!" , diz o homem na arena demoníaca e opressora do Roda Viva, Tv Cultura, do dia 24/9.


A entrevista não foi das melhores não. Ele não sabe se expressar e, na verdade o que importa, quem o entrevistou não tinha idéia do que ele falava. Em português claro ou escuro. O único preto mais ou menos favela era o Paulo Lins. Mas esse é comédia , filhote de Regina Casé, café com leite. Então o cenário era de um homem que nunca aparece na mídia, cuja habilidade para construir um raciocínio ao vivo é temerária, com aqueles seres de outro mundo perguntando abobrinhas salomônicas sobre os "seus manos", além de um medo e tensão no ar da parte dos entrevistadores. Vai que o negão fica puto e sai atirando. Era a cara dos brancos.


A entrevista foi das melhores sim. Pelo menos pra mim, que pude entender um pouco mais aquela cabeça, aquela de versos geniais, de obras peremptórias, do líder de um grupo que é escutado até no cú da Amazônia, nas maquinhas da vida. Foi boa porque tive a oportunidade de ouvir uma figura imensa dizer que é contraditório, que não quer que ninguém o siga, que é um pai ausente. Um artista "da periferia" (argh!) chamar traficantes de ‘comerciantes’, de ‘parceiros’ e ver a cara estupefata dos entrevistadores assépticos, que são incapazes de entender essa relação muito além do maniqueísmo burro de heróis e bandidos que existe "lá". Tive a oportunidade de ver um homem falar que a atitude é a do cotidiano, mesmo que tenha se enrolado horrores pra dizer, de criar a barreira provocativa , transparente e raivosa do "nós" (pretos, favelados, da quebrada) e "vocês" (brancos, frouxos, dominadores) , de citar a pirataria inevitável. "Os caras vêm e falam: ‘pô, brown, assina aqui pra gente vender o teu disco!’ Aí eu vou ter que fazer né. Os caras estão ali ralando, tem filho pra sustentar. É o meio de ganhar dinheiro. Eu dou força porque eles estão o dia inteiro enchendo o saco tocando a minha música". Vi um ser público falar bem da Marta Suplicy e zombar do José Serra (Você acha que eu vou votar em quem? no Serra?). Dizer que um homem de família deveria ter vergonha de receber o auxílio-família do Lula. Enfim, de uma figura mitológica e controversa falar asneiras, verdades, tropeçar, explicar e até rir.


Mano Brown , embora inteligível em um alto grau, e com todas as críticas que faço a ele, ainda é um homem livre.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Quanto custa um universitário? (Parte 1)



Saiu a pesquisa sobre os gastos em educação feita pela OECD, Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, . Além da conclusão já sabida que investimos pouco, muito pouco, no setor fundamental e médio (o pior entre os 34 países estudados), um dado que precisa nos fazer pensar: gastamos bem com os universitários. O Brasil é o país com a maior diferença entre os gastos entre estudantes dos setores básicos e superiores. Mas , além dos números, o que isso pode siginficar?


Bem, não sou dono da verdade mas coloco aqui alguns fatos que podem ajudar. E, como a Internet é o suporte do dinamismo por natureza, não vou me alongar muito.

O Brasil forma poucos engenheiros. Foda-se? Não. Esse dado nos diz que não há uma orientação educacional nas universidades nacionais. O capitalismo é a elegia do livre-arbítrio, mas alguma coisa está errada se pensarmos que as mentes brilhantes que saem de nossas academias não usem suas mentes brilhantes para as demandas do país. É como formarmos strippers gostosas em terra de homossexuais. Ou churrasqueiros numa tribo vegetariana. A informação não excita e apodrece. Do total de formados, apenas 5% são engenheiros, de acordo com o ibge 2005. Embora nerds, racionais extremos, espinhentos e incrivelmente chatos, eles são fundamentais para a estruturação urbana, desenvolvimento tecnológico e outros nomes compostos na indústria. Nos números da OECD divulgados esse ano, 69,8% dos brasileiros universitários cursam as ciências sociais, humanas e de negócios. Engenharia ? Apenas 4,5%. Física e matemática, 7,9%. Mais ainda.


De acordo com o Ibge, em 2005, cinco cursos de baixo custo representam 46,3% dos alunos universitários brasileiros, ou seja, quase metade (administração: 14,9%; direito: 12,8%; pedagogia: 9,3%; letras: 4,7%; e comunicação: 4,6%). Se os cursos de baixo custo formam metade do scratch canarinho, por que e onde gastamos muito com universitários? Com a tecnologia? Mas como se quase não formamos especialistas nas áreas caras? Essa pergunta fica mais intrigante quando vemos que praticamente metade dos que ingressam não se formam e, mais, dos que se formam, 53% não trabalha na área que suou tanto para concluir. Então gasta-se por nada? E que tipo de universitários formamos? Que mão-de-obra temos? Para onde vai o dinheiro da vovó? Quem achou o conhecimento que gastamos muito para ter?


Brincadeiras à parte, tais dados devem nos fazer questionar não só sobre um plano educacional, uma orientação do estado para a mão-de-obra que se forma, mas também até que ponto usamos os recursos públicos para servir a uma lógica privada, ou seja, será que gastamos muito formando jovens para que eles não retornem esse conhecimento apreendido para o país, mas sim para grandes empresas transnacionais?


Fora isso, onde estão especificamente esses gastos com o universitário brasileiro se as universidades públicas estão sucateadas? O gasto maior está nas privadas? Se estiver nas públicas (o relatório não especifica isso), é com os professores? Com a conta de luz e de gás? Com o quê? Onde se gasta se não há resultado educacional minimamente bom nas academias brasileiras? Ou será que existe esse resultado e não vemos quem formamos porque eles não trabalham com o objetivo de serem vistos por todos e sim por alguns poucos? Mais uma vez: não investindo quase nada na educação de base (o que supõe-se uma alfabetização do indivíduo, como cidadão, como ente coletivo, com o olhar do outro social, mais generalista e vasta) criamos cidadãos precários e investindo demais nas especializações (faculdades) criamos mão-de-obra manipulável desse mesmo cidadão precário?

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Shell deles (continuação)

Com relação ao texto da Shell que postei aí embaixo. Segue o exemplar comportamento das autoridades argentinas. Fecharam mais de 50 empresas em apenas seis meses. Eu , sinceramente, gostaria de ver algo parecido no Brasil.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Sicko


Michael Moore chegou. Após os premiados Tiros em Columbine e Fahrenheit 9/11, o documentarista de 53 anos de idade vai mostrar uma das imagens que mais incomodam o americano: Cuba. Na verdade, Sicko, seu novo filme, é sobre o sistema de saúde yankee, batendo demais nos planos e nos hospitais. Só que, ao fazer isso, mostra a eficácia ,na área , de uma ilhota controversa. A inimiga histórica liderada por Fidel.


Uma das passagens do longa mostra Moore saindo de Miami a bordo de um barco junto com dezenas de enfermos americanos, vários deles bombeiros e voluntários durante o 11 de Setembro. Eles chegam e pedem para ser atendidos na base norte-americana de Guantanamo (que atende combatentes da al-qaeda). Não obtém resposta e ,adivinha, são tratados com eficácia e seriedade pelo sistema público cubano. Independente de serem americanos.


"Me parece no mínimo imoral que 50 milhões de compatriotas não tenham acesso a um sistema de saúde decente. Isso no país mais rico do mundo. Uma criança de Detroit, hoje, tem pelo menos três anos a menos de expectativa de vida que um cubano". - disse Moore.


No mais, um retrato cruel, duro e sarcástico da máfia da saúde yankee. Que aprendamos a fazer uma relação com a máfia da saúde brasileira.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

No Shell deles




A secretaria de meio ambiente argentina fechou uma refinaria da Shell. A ação faz parte de um projeto de despoluição do Riachuelo, um dos rios que limita a área de Buenos Aires e que é considerado um dos mais poluídos do país.


O relatório da secretaria indica sérias irregularidades na planta da empresa, infiltrações de material combustível em depósitos , assim como acusa a Shell de retirar , sem autorização, cerca 430 milhões de litros de água do Rio da Prata. A notícia se junta a uma briga antiga entre a multinacional e o governo argentino. Já faz alguns meses que o secretário de comércio , Guillermo Moreno, acusa a petrolífera de desabastecimento deliberado de gasolina . Inclusive o presidente Kirscher, em agosto desse ano, chegou a pedir à justiça a prisão de alguns executivos da corporação. A Shell diz que , em auditorias privadas, não foram encontradas tais irregularidades.


O ponto aqui é mostrar como o Estado ainda pode (e, minha opinião, deve) fiscalizar as multinacionais. No Brasil, essas empresas são quase intocáveis. A nova falocracia das marcas vira um bundalelê de turista excitado na zona tupiniquim.


Não se tem notícia de multas ou ações tão peremptórias como a que o governo argentino realizou. Não houve a barganha "sem nós-sem empregos" que aqui existe. Se polui, se está irregular, se usa a água inadequadamente e não abastece os postos, está fora da lei e contra o povo. É isso. Zéfiní. Ridículo cair na ladainha da Shell de que "auditorias privadas" (lê-se conchavos promíscuos e relatórios mentirosos) não detectaram nada. No Brasil, o conto do vigário vira fato, que vira regra, que vira doutrina e, passado alguns anos, fé.