quarta-feira, 23 de abril de 2008
Catador de Façanhas
O futebol é muito. Tanto, que intelectuais fundos, do alto das coisas humanas e divinas, ainda sonham com uma pelota cheia de barro, com o drible descomunal e impossível no adversário fantasma, e o gol lento e eterno que o acorda ainda mais das noites insones. Tanto, que apesar de ganhar caminhos alheios ao caminho que deveria seguir, o futebol segue intuitivamente, como se seus deuses comprados não tivessem poder nenhum sobre o fogo roubado de um homem da bola.
De todos os times do mundo, o Boca me parece ser o que ainda cria seus mitos e o que ainda tem o futebol como silêncio e ato, não como palavra e invenção. Os mitos não são os montados pelas cores e imagens e sim os esculpidos de suor no campo e grito de uma torcida faraônica. Sua camisa pesa nos olhos de quem vê e na alma de quem veste. Redimensiona o mundo todo, e os todos do mundo, para um retângulo cujas linhas não delimitam fim nenhum, já que o ato não pode ser delimitado.
Os heróis , na Bombonera, ainda lutam por seu primeiro pedaço de pão, como se não tivessem história. Contraditoriamente, a história de luta está no invisível visível do espaço jogado. Riquelme olha Maradona ao errar um passe. Maradona, do alto de si mesmo, sofre com se ali padecessem seus ídolos, como se quisesse e temesse aquela bola tão estranha. O ego de cada um se compartilha lentamente até formar uma unidade. No desespero, na alegria, no quase, o futebol vai criando pensamento próprio e, por isso, já que sua grandeza não tem espelhos, funde a todos numa cor só. O azul e o amarelo se pagam numa sem-imagem inconfundível e cristalina da paixão xeneize, do que é além dessa paixão.
O Boca é o time que ainda está ao alheio aos deuses. Porque os deuses não se pensam. Mas também não se amam, nem se apequenam. Ainda é um bairro, antes de uma nação. Ainda é uma pelada entreônibus e fome, antes de um jogo oficial. Ainda prefere o gol à foto, a lenda ao fato, o cheiro de cansaço de uma vitória impossível à distância inodora e indiferente da derrota aceita.
O Boca precisava de tudo para se classificar à próxima fase da Libertadores. Mas precisou apenas de si mesmo. E o Boca, como o futebol, é muito mais do que existe.
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2 comentários:
muito legal caraaaa
riquellllllme!
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